Obama em África: <br> ingerência e domínio

A pro­moção dos in­te­resses eco­nó­micos dos Es­tados Unidos em África e o re­forço da in­ge­rência norte-ame­ri­cana no con­ti­nente es­ti­veram no centro da vi­sita de Ba­rack Obama ao Quénia e à Etiópia.

A des­lo­cação aos dois países da África Ori­ental, que re­cebem im­por­tante au­xílio mi­litar dos EUA, foi ro­deada de me­didas ex­cep­ci­o­nais de se­gu­rança e de uma enorme cam­panha de pro­pa­ganda me­diá­tica.

A agenda afri­cana de Washington co­meçou no início da se­mana pas­sada, quando o novo pre­si­dente da Ni­géria, Muham­madu Buhari, man­teve con­ver­sa­ções na Casa Branca vi­sando me­lhorar as re­la­ções eco­nó­micas e mi­li­tares entre os dois es­tados. Obama afirmou que a Ni­géria, o pri­meiro pro­dutor de pe­tróleo em África, «é um dos países mais im­por­tantes do mundo». E pro­meteu mais apoio a Abuja na luta contra os ra­di­cais do Boko Haram, cujos aten­tados e ata­ques têm pro­vo­cado mi­lhares de ví­timas na Ni­géria mas também no Níger, nos Ca­ma­rões e no Chade.

À che­gada a Nai­robi, na sexta-feira à noite, Obama, ro­deado de câ­maras de te­le­visão, en­con­trou-se com a meia-irmã, a avó adop­tiva e ou­tros mem­bros do ramo que­niano da fa­mília. «Por ra­zões de se­gu­rança» não foi a Ko­gelo, a al­deia natal do pai.
As re­la­ções eco­nó­micas entre os EUA e a África es­ti­veram pre­sentes. Obama elo­giou o di­na­mismo de «um con­ti­nente em mo­vi­mento», onde se si­tuam mer­cados em rá­pido cres­ci­mento e emerge uma classe média. E apro­veitou para inau­gurar a Ci­meira Em­pre­sa­rial Global, em louvor à ini­ci­a­tiva pri­vada.

Com­pre­ende-se a pre­o­cu­pação dos di­ri­gentes norte-ame­ri­canos: os EUA são hoje o se­gundo maior in­ves­tidor em África, com 80 mil mi­lhões de dó­lares. Foram ul­tra­pas­sados pela China, que in­veste mais do dobro – 200 mil mi­lhões – e que li­dera desde 2009 as trocas co­mer­ciais com os países afri­canos.

Nos dois dias de es­tada, Obama falou aos jor­na­listas, en­con­trou-se com jo­vens, deu con­se­lhos. Apelou à «mu­dança de men­ta­li­dades» sobre a cor­rupção e a edu­cação das mu­lheres. De­nun­ciou as di­vi­sões ét­nicas e os pe­rigos de uma «po­lí­tica ba­seada na per­tença a uma tribo ou etnia». Di­ver­gindo do pre­si­dente Uhuru Kenyatta, de­fendeu os di­reitos dos ho­mos­se­xuais em África, com­pa­rando a ho­mo­fobia à dis­cri­mi­nação ra­cial exis­tente na so­ci­e­dade norte-ame­ri­cana. E prestou ho­me­nagem às ví­timas do aten­tado da Al-Qaeda contra a em­bai­xada dos EUA na ca­pital, em 1998, em que mor­reram mais de 200 pes­soas.

Nada de novo


A questão da se­gu­rança foi re­to­mada na Etiópia, um dos países mais po­pu­losos de África e com taxas de cres­ci­mento de dois dí­gitos. Que re­cebe uma ajuda mi­litar dos EUA de cerca de 800 mi­lhões de dó­lares anuais e onde há uma «de­mo­cracia mus­cu­lada» que não pa­rece in­co­modar os de­fen­sores dos di­reitos hu­manos. Nas re­centes elei­ções le­gis­la­tivas, em Maio, o par­tido no poder, a Frente De­mo­crá­tica Re­vo­lu­ci­o­nária do Povo Etíope, e ali­ados, con­quis­taram a to­ta­li­dade dos 547 lu­gares no par­la­mento…

Fa­lando na se­gunda-feira, em Addis Abeba, ao lado do pri­meiro-mi­nistro Hai­le­ma­riam De­sa­legn, o pre­si­dente norte-ame­ri­cano enal­teceu os re­sul­tados ob­tidos pelas forças afri­canas (da Etiópia, Quénia e Uganda) na So­mália, no com­bate ao grupo Al Shabab. Na vés­pera, a mi­lícia is­lâ­mica levou a cabo mais um aten­tado à bomba em Mo­ga­díscio, cau­sando a morte de 13 pes­soas e des­truindo um hotel que abri­gava em­bai­xadas na ca­pital so­mali.

Não está pre­visto por agora o envio de tropas norte-ame­ri­canas para a So­mália, até porque os EUA dis­põem de uma grande base mi­litar no vi­zinho Dji­buti, têm ali aviões de com­bate e drones, gozam de ou­tras «fa­ci­li­dades mi­li­tares» na re­gião. Isso mesmo con­firmou Obama: «Há uma com­ple­men­ta­ri­dade entre as nossas forças ar­madas. Dis­pomos de re­cursos que ou­tros talvez não pos­suam, mas não temos que en­viar os nossos ma­rines [para a So­mália] porque etíopes, que­ni­anos e ugan­deses são grandes com­ba­tentes».  
Nesta quarta in­cursão em África – de­pois de Accra e Cairo, em 2009, e da vi­agem por vá­rios países, em 2013 –, Obama tornou-se na terça-feira, 28, o pri­meiro pre­si­dente dos EUA a dis­cursar na sede da União Afri­cana, em Addis-Abeba.

A di­ri­gente da Co­missão Afri­cana, a sul-afri­cana Nko­sa­zana Dla­mini-Zuma, con­si­derou a vi­sita his­tó­rica e «um passo con­creto para am­pliar e apro­fundar as re­la­ções» entre a or­ga­ni­zação pan-afri­cana e os EUA.

Mas a ver­dade é que Obama não disse nada de novo, abor­dando temas nele ha­bi­tuais como a «de­mo­cracia» e a «luta contra o ter­ro­rismo». Ou por ou­tras pa­la­vras, a forma de manter e am­pliar a in­ge­rência e o do­mínio im­pe­rial dos Es­tados Unidos em África.

 




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